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30. Quase Memória

'Vida ainda me espanta', diz Cony na posse na ABL

(publicado em 01/06/2000)

CRISTINA GRILLO
da sucursal do Rio

O escritor Carlos Heitor Cony, 73, tornou-se ontem, às 21h35, o mais novo integrante da ABL (Academia Brasileira de Letras), dizendo que a vida continua a lhe "provocar espanto".

"Não sendo completamente boa nem má, a vida continua a me provocar espanto. Aqui estou eu, na tribuna mais ilustre do país, com minha péssima oratória, tomando posse da cadeira número 3, cujo patrono, Arthur de Oliveira, foi definido pelo próprio Machado de Assis como um saco de espantos", disse no discurso.

O escritor, membro do conselho editorial da Folha, discorreu sobre seus antecessores na cadeira. Falou dos "textos esparsos" de Arthur de Oliveira, amigo de Machado de Assis, e do romance regional de Herberto Sales, morto em 1999. Citou ainda o historiador Roberto Simonsen e o ministro da Fazenda do governo Artur Bernardes, Aníbal Freire da Fonseca.

A posse de Carlos Heitor Cony foi concorrida: 24 dos 39 imortais compareceram à cerimônia. Entre os presentes, acadêmicos que pouco frequentam os salões da ABL, como o senador José Sarney e o cirurgião plástico Ivo Pitanguy, e celebridades, como a atriz Fernanda Montenegro.

Amigos da adolescência também estiveram presentes, como o bispo diocesano de Piracicaba, dom Eduardo Koaik, com quem Cony frequentou o seminário.

A apresentadora do "Mais Você" da TV Globo, Ana Maria Braga, gravou uma entrevista com Cony que será exibida hoje.

A apresentadora perguntou se ele realmente sentia-se desconfortável com o fato de, como acadêmico, receber uma espada (uma das tradições da ABL).

"Pensei que fosse um espadim de brincadeira, mas é uma espada de verdade. Posso até matar uma pessoa com ela", disse Cony.

Do lado de fora, o personagem conhecido como "Beijoqueiro", José Moura, fazia um protesto solitário. Moura queria entrar no prédio da ABL para beijar Cony.

O novo imortal foi saudado pelo ex-presidente da Academia Arnaldo Niskier. Recebeu o diploma do jurista Evandro Lins e Silva, a espada de Josué Montelo e o colar de acadêmico de Lygia Fagundes Telles. Cony foi escoltado ao salão nobre pelos imortais Eduardo Portella, Pitanguy e Sarney. "Estamos te levando para a Catedral de São Pedro", brincou Sarney.

Participaram da cerimônia o prefeito do Rio, Luiz Paulo Conde, o secretário estadual de Cultura, Adriano Aquino e o governador da Paraíba, José Maranhão (PMDB), escritores e editores.

Cony diz que sua vida virou de cabeça para baixo há cerca de um ano, quando começaram as articulações para sua candidatura.

"Quando dei por mim, estava muito enfronhado. Antes disso, para mim, a Academia era uma galáxia diferente, um buraco negro na última prateleira do universo", disse antes da posse.

Cony conta que passou a ser procurado por acadêmicos propondo sua candidatura a partir de artigos que fez na Folha defendendo a candidatura do ex-ministro do Planejamento Roberto Campos para substituir o dramaturgo Dias Gomes, morto em maio do ano passado.

"Entrei de gaiato em uma briga que não era minha por causa do Roberto Campos. Sou amigo dele há muitos anos, embora discorde de suas idéias também há anos. Mas houve toda a polêmica em torno da candidatura e eu escrevi que, se fosse acadêmico, não votaria nele, mas que sua candidatura era lícita", afirmou.

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