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Bravura e honra embalam "O Velho e o Mar"

(16/08/2003)

Última e mais famosa obra de Ernest Hemingway, premiada com o Pulitzer em 1953, chega às bancas amanhã

MARCELO FERRONI
free-lance para a Folha

Ernest Hemingway (1899-1961) foi um escritor cuja vida ficou tão famosa quanto seus melhores livros. Foi testemunha ocular das duas guerras mundiais, acompanhou de perto a Guerra Civil Espanhola (1936-39), aventurou-se em safáris pela África e, aos 62 anos incompletos, suicidou-se com um tiro de uma de suas armas de caça.

No meio de tudo isso, criou obras-primas como "O Sol Também se Levanta" (1926), "Adeus às Armas" (1929) e "Por Quem os Sinos Dobram" (1940) e influenciou a escrita no século 20, com seu estilo econômico e direto. "Foi a fusão do artista sensível e original com o musculoso homem de ação que transformou Ernest Hemingway num dos maiores mitos internacionais do século 20", disse o escritor inglês Anthony Burgess (1917-93) em biografia a seu respeito.

"O Velho e o Mar", de 1952, é o último trabalho que Hemingway publicou em vida. Para muitos, é também a sua obra mais importante. Ela lhe valeu o Prêmio Pulitzer em 1953 e, no ano seguinte, foi decisiva para que o escritor ganhasse o Prêmio Nobel.

O livro gira em torno de Santiago, um pescador cubano, idoso e empobrecido. Seus companheiros acreditam que sua carreira está perto do fim. A única pessoa que ainda confia em suas habilidades é um garoto que o ajudara em outras ocasiões, mas que havia sido proibido pelos pais de o acompanhar em novas pescarias.

Disposto a recuperar a sorte e o prestígio, Santiago parte sozinho para o alto-mar, onde trava uma luta de três dias na caçada a um peixe. "Como o matador com seu touro, sente-se atraído por aquela criatura magnífica, de tal modo que, embora um tenha que matar o outro, não importa quem matará quem", escreve Burgess.

A caçada de Santiago aborda dois temas centrais de sua obra. A bravura, na luta do homem com a natureza, e a honra, que permanece intacta mesmo na hora da derrota. "O homem não foi feito para a derrota", escreve Hemingway, em um dos momentos mais importantes do livro. "Ele pode ser destruído, mas não derrotado."

Vida conturbada

Muito do que se sabe da vida do escritor norte-americano é fruto de exageros e invenções do próprio Hemingway, preocupado em criar um mito ao redor de sua imagem. Encorpado, com 1,80 m de altura, foi caçador, pescador e até boxeador nas horas livres. Dizia que preferia beber e falar de touradas a conversar sobre literatura e costumava chamar para a briga críticos que o contrariavam.

Como disse Burgess, "Hemingway era, tanto quanto seus livros, uma criação, e uma criação bem inferior a eles". Algumas das histórias que contava eram mentiras deslavadas, como a de ter sido amante de Mata Hari durante a Primeira Guerra Mundial.

Outras, menos exageradas, foram construídas em cima de eventos reais. Ao sair de um avião em chamas na África, por exemplo, ele teria gritado, com uma garrafa de gim e um cacho de bananas nos braços: "Ando tendo muita sorte" (o acidente ocorreu em 1954 e lhe valeu ferimentos e queimaduras graves pelo corpo).

Hemingway nasceu em 21 de julho de 1899, o segundo de seis filhos de Clarence Edmonds Hemingway, um clínico geral de Illinois que incutiu na criança o gosto pela caça e pesca. A busca pela aventura veio cedo. Em 1918, o jovem Hemingway, impedido de se alistar no Exército dos EUA por problemas de visão, obteve o cargo de motorista de ambulância para a Cruz Vermelha. Foi assim que participou da Primeira Guerra Mundial. Ferido na perna durante uma missão de resgate, voltou à sua terra natal como herói.

Em 1920, já casado com a primeira de suas quatro mulheres, partiu para Paris. Foi a partir dessa época que começou a buscar o estilo que o tornaria famoso. Sua luta era por escrever uma "frase simples, declarando a verdade".

Nos conflitos posteriores na Europa, participaria sempre como correspondente de guerra, sem entrar em combate. É dessa época a paixão do escritor pelas touradas, tema recorrente em sua obra.

As excursões à África também lhe renderam boas histórias, principalmente sob a forma de contos (como "As Neves do Kilimanjaro", de 1938), arte que o autor dominava, seja pela estrutura enxuta, seja pela objetividade.

Em "O Velho e o Mar", maior que um conto, menor que seus demais romances, essa busca de Hemingway pela clareza e concisão pode ser vista em seu apogeu. O livro, pequeno e surpreendente, acabou se tornando uma obra-prima para o século 20.

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