3. O Amante - Textos publicados na Folha
Agarra-agarra
(publicado em 03/07/1998)
MARILENE FELINTO
enviada especial a Lésigny
Não tem gol, não tem Owen, não tem drible nem passe que se iguale aos momentos amorosos dos super-homens, dos megahomens reduzidos aos meninos que eles são no pátio da escola, rolando na grama na aula de educação física.
Um castelo cheio de homens metade cavalos metade meninos. Não tem cena mais excitante para se ver nos ambientes da Copa-98: o momento mais bonito é essa socialização dos rapazes recém-saídos da puberdade, o crescimento acelerado do corpo, a hipermuscularidade, a hipermobilidade dos supermembros.
Na hora da parceria sem compromisso, eles se associam, Roberto Carlos com Denílson, Bebeto com Júnior Baiano, Leonardo com Ronaldinho, feito companheiros de bola de gude, de figurinha. Até mesmo Edmundo vira um ursinho de pelúcia abafado pelo abraço de Júnior Baiano.
É um companheirismo de orangotangos jovens, ombros curvos, pesando sobre as costas largas, o ar desengonçado de adolescentes. Eles se divertem, pulam uns sobre os outros, se abraçam, mostram a língua e viram cambalhota para todo mundo ver, mas como se ninguém os estivesse vendo.
As mulheres vêem (e os fotógrafos). A escritora francesa Marguerite Duras disse a Platini, numa entrevista: "O jogador de futebol está num terreno completamente exposto. Se ele mente, todo mundo vê. Se sente medo, todo mundo vê. Qualquer besteira que faça, todo mundo vê. Qualquer pequena indecência, todo mundo vê".
Platini respondeu: "Isso é facilmente visto por quem entende de futebol, mas dificilmente é percebido por quem não entende". Ao que Marguerite Duras retrucou: "Claro que vocês percebem isso no âmbito do jogo. Mas tem gente que observa também os jogadores. As mulheres, por exemplo...".
É. Lá estão eles vivendo a utopia da infância infinita. Homem é assim mesmo, metade cavalo, metade menino. O jeito é perdoar essa idiotice nata, esquecer que eles jogam bola, não crescem nunca e querem mesmo é colo, sempre.
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