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10. Cem Anos de Solidão - Textos publicados na Folha

Aos 60, García Márquez volta a ser repórter

(publicado em 31/01/1999)

MARIE DELCAS

Convidado, em 7 de janeiro último, para a cerimônia de abertura das negociações de paz do governo com as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), Gabriel García Márquez disse que preferia estar presente na condição de simples repórter.

O autor colombiano, 60, Prêmio Nobel de Literatura de 1982, quer retomar o jornalismo, sua primeira profissão, "ofício tão incompreensível quanto voraz, cuja obra se esgota a cada artigo e recomeça no instante seguinte com ainda mais ardor".

"Gabo", como é conhecido, anunciou sua intenção em 1996, no lançamento de seu livro "Notícia de um Sequestro" (edit. Record, 320 págs).

Ao lado de seis respeitados jornalistas colombianos, ele acaba de comprar 50% da revista "Cambio", a segunda maior publicação política semanal do país.

"Cambio" é herdeira de "Cambio 16 Colômbia", tentativa malsucedida de criar uma versão colombiana da revista espanhola "Cambio 16". Sua circulação atual é de 50 mil exemplares.

Patricia Lara, ex-proprietária, vendeu a revista após seis anos de dificuldades financeiras. "Estou cansada", explicou à concorrente "Semana". "Que recompensa melhor poderia ter do que passar a revista para as mãos do maior escritor colombiano?"

As cenas do início das negociações de paz, ocorrida em plena floresta amazônica, foram dignas do "realismo mágico" que caracteriza a obra de García Márquez: o chefe da segurança nacional da Colômbia coordenou as operações em conjunto com os comandantes das Farc. Guerrilheiras maquiadas e armadas até os dentes davam autógrafos e posavam para fotos.

Qual será o papel do escritor na revista? "Acionista majoritário e repórter", responde uma jornalista de "Cambio". "Ele é capaz de passar horas corrigindo um artigo. Nada lhe passa desapercebido, desde o conteúdo até o último ponto e a última vírgula."

Ele tem aproveitado seus contatos com nomes poderosos dentro e fora da Colômbia para impulsionar algumas das principais causas de seu país: as relações com os países vizinhos, especialmente Cuba, a reforma da educação e, sobretudo, o fim do conflito armado.

Mas, apesar da aparente unanimidade em torno de seu nome, alguns colombianos o criticam por sua amizade com Fidel Castro.

Outros não o perdoam por haver defendido a candidatura do conservador Andrés Pastrana (eleito em 98), "herdeiro do bipartidarismo tradicional e queridinho da oligarquia", segundo a própria revista "Cambio".

Tradução de Clara Allain

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