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15. Pantaleón e as Visitadoras - Textos publicados na Folha
'Erotismo é sinal de civilização', diz Llosa
(publicado em 10/09/1997)
JOSÉ GERALDO COUTO
especial para a Folha
Começa a chegar às livrarias sexta-feira a edição brasileira do novo livro de Mario Vargas Llosa, ''Os Cadernos de Don Rigoberto'' (Companhia das Letras).
O romance alterna a narração do drama conjugal do personagem-título com trechos de seus cadernos de anotações, em que aparecem fantasias eróticas, cartas e reflexões.
Lançado em maio, o livro já vendeu 400 mil exemplares nos países de língua espanhola.
O escritor peruano, que prepara um romance situado na República Dominicana nos últimos meses da ditadura de Trujillo, vem ao Brasil em novembro para uma palestra na Academia Brasileira de Letras, no Rio, e para a feira de livros de Campo Grande (MS).
Vargas Llosa falou à Folha por telefone, de sua casa em Londres.
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Folha - O erotismo é o grande protagonista dos ''Cadernos de Don Rigoberto''. Por que o tema lhe interessa tanto?
Mario Vargas Llosa - Creio que, se há um elemento protagonista do que chamamos civilização, é o erotismo. Porque o erotismo só existe em sociedades que alcançaram um alto nível de civilização. Quanto mais primitiva uma sociedade, menos erótica ela é.
O amor numa sociedade primitiva está muito próximo da cópula animal, da satisfação do instinto reprodutor, enquanto nas sociedades que chamamos civilizadas o amor foi se enriquecendo, refinando e humanizando graças à imaginação e às formas rituais, a uma certa teatralidade.
Folha - O sr. concorda com Georges Bataille quando ele diz que o erotismo é essencialmente subversivo, pois contraria a tendência utilitária da organização social?
Vargas Llosa - Sim. O erotismo não está de modo algum subordinado à reprodução, que seria o aspecto utilitário do amor. O erotismo faz do amor um fim em si mesmo, não um meio para prolongar a espécie. E justifica o prazer em termos que poderíamos chamar não somente hedonistas, mas também artísticos.
Admiro muito Bataille, mas sua descrição do erotismo sempre me pareceu um pouco lúgubre. Ele elimina do erotismo um aspecto fundamental: o regozijo, o humor, a diversão.
Folha - O sr., como don Rigoberto, vê o erotismo como um refúgio do indivíduo contra a padronização da vida contemporânea?
Vargas Llosa - Sem nenhuma dúvida. O erotismo expressa a individualidade em estado puro. Em tudo o mais, talvez, os seres humanos podem se parecer. Na hora de fazer amor, cada um expressa suas próprias fantasias, sua experiência mais pessoal, sua criatividade.
Folha - Como o sr. distingue o erotismo da pornografia?
Vargas Llosa - A pornografia é o genérico. É aquela atividade que soterra o erotismo utilizando produtos manufaturados impostos à sociedade por meio da publicidade, quer dizer, por meio de uma forma de alienação coletiva.
Talvez a pior consequência da pornografia seja o fato de que ela desindividualiza o amor.
O sujeito renuncia a suas próprias fantasias e as substitui por esses produtos manufaturados, por exemplo as revistas ''Playboy'' ou ''Penthouse''. Esse erotismo pré-fabricado implica a renúncia à criatividade.
Folha - O erotismo exige regras próprias de expressão estética?
Vargas Llosa - O erotismo exige um certo padrão estético, um nível de criatividade elevado, uma certa cultura. Não há erotismo sem cultura. O erotismo é incompatível com a ignorância, com a vida primitiva. Requer um grau de refinamento elevado e requer, além disso, uma certa espiritualidade investida na ação amorosa.
Não se trata somente de satisfazer uma necessidade física. Trata-se também de realizar um certo ato de tipo espiritual.
Folha - A literatura erótica implica vários problemas de linguagem, de como escrever o erótico...
Vargas Llosa - A linguagem que tem a ver com o amor físico está muito contaminada de estereótipos, de clichês. Talvez minha maior dificuldade nesse livro tenha sido rechaçar o lugar-comum, buscar uma forma que desse espontaneidade, uma certa originalidade à escritura erótica.
Um instrumento para evitar a vulgaridade foi o humor. Usei muito o humor como um contrapeso contra o que há às vezes de vulgar na expressão da experiência erótica. E também a cultura. A cultura aparece no livro como um contexto de referências literárias, plásticas, musicais --tudo isso para evitar o clichê e conferir uma certa consistência de tipo artístico à experiência erótica.
Folha - Como chegou à estrutura final do livro, que alterna ficção e ensaio?
Vargas Llosa - A princípio eu tinha a idéia de uma obra montada em torno de Fonchito (filho de don Rigoberto) e de sua identificação com o pintor Egon Schiele.
Mas depois o personagem de don Rigoberto foi se impondo a mim com a idéia dos cadernos, a idéia desse homem diante de seus fantasmas, tentando preencher o vazio que lhe deixou a separação da mulher com fantasias, utilizando a cultura para mobiliar suas fantasias eróticas.
Fonchito acabou deslocado para segundo plano, e as fantasias de don Rigoberto se tornaram o grande protagonista.
Folha - Seu livro está sendo publicado esta semana no Brasil.
Vargas Llosa - Se há um país que entende o erotismo e o pratica, é o Brasil. Estou curioso para ver como os brasileiros lerão o livro.
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