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"O Nome da Rosa" tem trama labiríntica
(15/06/2003)
CASSIANO ELEK MACHADO
da Folha de S.Paulo
É do próprio Umberto Eco a definição mais precisa sobre seu romance "O Nome da Rosa". "Até o leitor ingênuo percebeu que se encontrava diante de uma história de labirintos", cravou o italiano, em breve ensaio que escreveu sobre sua obra mais famosa.
Pois hoje é um desses raros dias em que as bancas de jornal se transformam em passagens secretas para labirintos.
A Biblioteca Folha está lançando hoje uma nova edição desse clássico contemporâneo, que marcou a estréia do influente ensaísta no campo da ficção. Publicado em 1980, "O Nome da Rosa" se transformou logo depois em um dos grandes fenômenos editoriais das últimas décadas.
Tanto seu editor italiano quanto Eco declararam que a expectativa máxima de vendas era de 30 mil exemplares. E é para os 30 milhões de leitores, em todo o mundo, que caminha o livro, que já disputa com "O Leopardo" (1958), de Giuseppe Lampedusa, o posto de romance mais vendido da história da Itália.
Poucas vezes uma multidão tão grande folheou uma obra tão complexa, ainda que a complexidade de "O Nome da Rosa" seja ela também um labirinto.
Autor do clássico ensaio "Obra Aberta", de 1962, no qual discutia a possibilidade de "uma pluralidade de significados em um só significante", Eco criou um romance que pode ser lido em diversas camadas de profundidade.
Ao olhar mais ligeiro, temos um frei chamado Guilherme de Baskerville e seu ajudante Adso de Melk, torneados à imagem e semelhança do detetive Sherlock Holmes e seu caro Watson, que topam, em uma abadia italiana no século 14, com uma série de misteriosos assassinatos.
Essa roupagem policial, enfatizada na adaptação do livro para o cinema, pelo francês Jean-Jacques Annaud, em 1986, pode prender o leitor até o final. Eco conduz com maestria o visitante dos corredores escuros por uma série de indícios que levam a crer em tramas passionais ou religiosas por trás das mortes violentas de monges.
Mas Eco, de novo no livro "Pós-Escrito ao Nome da Rosa", adianta: "É um romance policial no qual se descobre muito pouco".
Aí é que o labirinto começa a se estreitar. Nos bastidores de "O Nome da Rosa", pelo menos em parte deles, existe uma série de intrincados debates os quais o leitor dificilmente desvendará.
Por trás dos "quem matou quem" estão disputas como a do racionalismo, personificado por Baskerville, com o misticismo, na pele do bibliotecário Jorge de Burgos (clara homenagem ao argentino Jorge Luis Borges), além de querelas econômicas, políticas, relacionadas ao poder na Igreja Católica, e filosóficas -o que é a verdade?, podemos chegar a ela?
Eco, vale repetir, diz que não chegaremos a "descobertas". Mas a pista mais consistente de sua posição talvez esteja em uma frase de Guilherme de Baskerville, relatada pelo narrador Adso.
Em meio a uma busca frenética a um misterioso segundo livro da obra "Poética" de Aristóteles, supostamente sobre o riso, ele comenta: "Talvez a tarefa de quem ama os homens seja fazer rir de verdade, porque a única verdade é aprendermos a nos libertar da paixão insana pela verdade".
Eis aí o riso irônico de Umberto Eco. Homem de tantas verdades na semiótica, estética e teoria da comunicação, o professor da Universidade de Bolonha acaba levando multidões de todo o mundo a uma longa turnê pela "inverdade" nos labirintos da ficção.
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