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Hemingway não resiste em 'No Amor e na Guerra'

(publicado em 01/08/1997)

MARCELO REZENDE
da Reportagem Local

A primeira paixão do escritor Ernest Hemingway (1899-1961) é tema e único interesse possível em "No Amor e na Guerra", filme do diretor Richard Attenborough que chega hoje aos cinemas.

Em meados da década de 10, quando era apenas mais um garoto sonhador do interior dos EUA, Hemingway, o futuro fantasma a ser combatido --ou idolatrado-- na literatura norte-americana, ainda recém saído da adolescência, chegou à Europa para participar da Primeira Guerra Mundial (1914-1918).

Suas aventuras --militares e amorosas-- talvez hoje servissem apenas a fanáticos. Isso se o escritor não as tivesse transformado em romance, no livro "Adeus às Armas" (1929).

Na obra, o escritor --o herói da prosa direta e limpa-- narra o desejo avassalador de um soldado, vindo da América, por uma enfermeira. Uma história que rapidamente foi reconhecida como um disfarce desajeitado do relacionamento de Hemingway com Agnes von Kurowsky, a mulher que cuidou de seus ferimentos em Milão.

O interesse de Attenborough não está, na verdade, na versão contada por Hemingway em seu romance, ou na de seus amigos poucos discretos, mas na da de Agnes.

Seu "No Amor e na Guerra" é uma adaptação do livro "Hemingway in Love and War", que traz cartas de Agnes ao escritor e também os diários sobre o relacionamento que tiveram.

A intenção, de início cativante, é tentar contar um surrado episódio na vida de um notável do ponto de vista contrário, à maneira de um espelho. E Hemingway, escritor de talento indiscutível e mentiroso compulsivo, serviria de forma exemplar a essa revisão.

O filme, então, estaria em uma curiosa mistura de planos, onde há o personagem real --famoso por fazer fantasia de fatos-- visto agora sob um olhar supostamente mais "verdadeiro" (o da enfermeira), que se submete, ainda, às regras e esquemas de uma ficção cinematográfica.

Mas, claro, estamos no mundo de Attenborough. Isso significa converter em nulidade qualquer grande possibilidade, desfazer com a mão esquerda o que é construído com a direita.

Em seu cinema, (como em "Gandhi") uma vida --e ele parece adorar a "biografia dos grandes"-- interessa menos do que a chance de transformá-la em um grande folhetim, que se afoga no tom esquemático e na rasa dimensão de seus personagens.

Hemingway é um dos grandes mitos da cultura norte-americana deste século, cultuado tanto por sua obra quanto por suas ações: a de um homem que adorava mulheres, conflitos e literatura.

Parece risível, então, ter o ator Chris O'Donnell usando suas fardas e falas, com Sandra Bullock, um atriz que é um mistério (não é excepcionalmente bela, talentosa ou carismática para justificar sua fama), fazendo o contraponto romântico.

De qualquer maneira, os dois rimam com as limitações de Attenborough, que insiste em adornar sua novela com um pretenso mergulho em um tema maior, a irracionalidade de um guerra.

Tudo em "No Amor e na Guerra" comprova, por fim, uma suspeita sobre seu diretor. Não se trata apenas de falta de talento, mas também da desonestidade de alguém que procura mascarar um raso comercialismo.

Filme: No Amor e na Guerra
Produção: EUA, 1997
Direção: Richard Attenborough
Com: Chris O'Donnell, Sandra Bullock
Quando: a partir de hoje nos cines Paulistano, Eldorado 6 e circuito

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